Após um ano de quedas acentuadas na cotação internacional do barril de petróleo, a indústria não espera uma retomada dos preços antes de 2018. O barril abaixo de US$ 40, na terça-feira, sepultou as expectativas de uma situação conjuntural e levou as petroleiras a reverem projeções.
A Petrobrás já adiou a abertura de capital da BR Distribuidora e não descarta suspender a venda de ativos este ano. A desvalorização acumulada de quase 48% das cotações do petróleo é definida como uma "mudança de paradigma" que provoca, além dos cortes de investimentos, uma queda brusca na arrecadação de impostos, agravando a crise dos municípios.
Alex Régis
"Estamos vivendo o fim de um ciclo, e é difícil enxergar no nevoeiro da transição", avalia Jorge Camargo, presidente do Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP). Segundo ele, a situação não é "transitória". "Poucas empresas estão trabalhando com a hipótese de aguentar firme que o preço vai voltar. Está se formando um consenso de que as variáveis mudaram. Empresas avaliam seus projetos para 2016 com valores na faixa de US$ 50 por barril."
Estudo publicado na segunda-feira pela US Energy Information Administration, órgão americano de análise do setor, indica que a produção global de óleo teve, em 2015, a maior alta média em 17 anos. Entre as razões estão o sucesso, nos EUA, da extração de petróleo de xisto, de alto impacto ambiental, e a retomada da produção do Iraque e do Irã, após acordo diplomático que retirou sanções econômicas impostas aos países.
"Nunca se produziu tanto petróleo e nunca houve tanto óleo estocado. Esse cenário deixa os preços a US$ 40 e em viés de baixa, o que exige muito cuidado para as empresas", avalia Lavinia Hollanda, coordenadora de pesquisa da FGV Energia. "Associado a uma tendência quase irreversível por uma demanda menor, o cenário deve permanecer no médio prazo."
Uma das mudanças já em curso é a atuação da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), que deixou de se preocupar com a fixação dos preços para priorizar seu nível de participação no mercado. A Arábia Saudita é uma das mais beneficiadas, com volumes de exportação acima de 5 milhões de barris por dia e custo de produção abaixo de US$ 25.
"Desde o ano passado, os sauditas sinalizam que não serão mais definidores de preço, mas querem manter o market share. Eles têm condição de fazer isso em função da vantagem competitiva pelo custo inferior de produção", explica Roberto Santos, sócio do Centro de Energia e Recursos Naturais da EY.
Pré-sal. Para a Petrobrás, a viabilidade do pré-sal é garantida até o patamar de US$ 30. Segundo o diretor da estatal PPSA, Renato Darros, a queda deixa "a indústria toda sob ameaça", e não apenas o pré-sal brasileiro. "Será uma ameaça se esse nível se mantiver e for uma nova realidade. Hoje, não dá para falar que é uma ameaça, porque a gente olha para a frente."
Entretanto, a queda afeta marginalmente a cadeia do setor, à medida que interfere sobre o planejamento de leilões, fundamentais para manter a indústria de suprimentos aquecida. As empresas têm adotado diferentes estratégias para se adaptar ao cenário imprevisível. A primeira medida foi o corte de gastos, que chegou a patamares de 40% entre as principais petroleiras multinacionais. Agora, as empresas buscam reduzir o custo dos projetos e inovar em tecnologia.
As empresas também vão vender ativos, como a Petrobrás, mas avaliam o risco de um excesso de vendas a preços desfavoráveis. A situação levou a estatal a revisar seu plano de desinvestimentos, que previa arrecadar US$ 57 bilhões.
"Diante da redução do fluxo financeiro, a empresa precisa buscar os desinvestimentos ou novas parcerias para ganhar fôlego de caixa. Mas o momento não é o mais favorável para quem está vendendo. Podemos ter uma superoferta de ativos à venda, o que puxa o preço para baixo. As empresas que não estão tendo facilidade", diz Santos, da EY.
Demissões. As mudanças já provocaram demissões no setor e o cancelamento de projetos. Outra consequência é a queda na arrecadação dos governos. Para Lavinia, da FGV, a queda causa impacto no "equilíbrio fiscal" de países como Venezuela e Rússia altamente dependente da exportação. "Qual o break even (ponto de equilíbrio) fiscal desses países? Países exportadores dependem dessa venda para fechar as contas. Estamos falando de Rússia, Venezuela, que têm cenário político sensível, e tinham break even com barril acima de US$ 80. Qual a capacidade desses países em cenário de desconforto político, manter a produção e conviver com esse preço nesses níveis atuais?", questiona.
O problema afeta ainda os municípios. "A receita generosa dos royalties que chegou aos municípios provocou um sentimento nas gestões municipais de que poderiam viver de renda. O Estado atuou pouco para gerir uma política de desenvolvimento regional, como a criação de um fundo para reduzir o impacto das perdas. Não se aproveitou o momento. Agora, nunca mais vamos ter uma situação como a que se vivia", avalia o professor do Instituto Federal Fluminense (IFF), de Campos, Roberto Moraes.
Estadão Conteúdo
A Petrobrás já adiou a abertura de capital da BR Distribuidora e não descarta suspender a venda de ativos este ano. A desvalorização acumulada de quase 48% das cotações do petróleo é definida como uma "mudança de paradigma" que provoca, além dos cortes de investimentos, uma queda brusca na arrecadação de impostos, agravando a crise dos municípios.
Alex Régis
O barril abaixo de US$ 40, na terça-feira, sepultou as expectativas de uma situação conjuntural e levou as petroleiras a reverem projeções
"Estamos vivendo o fim de um ciclo, e é difícil enxergar no nevoeiro da transição", avalia Jorge Camargo, presidente do Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP). Segundo ele, a situação não é "transitória". "Poucas empresas estão trabalhando com a hipótese de aguentar firme que o preço vai voltar. Está se formando um consenso de que as variáveis mudaram. Empresas avaliam seus projetos para 2016 com valores na faixa de US$ 50 por barril."
Estudo publicado na segunda-feira pela US Energy Information Administration, órgão americano de análise do setor, indica que a produção global de óleo teve, em 2015, a maior alta média em 17 anos. Entre as razões estão o sucesso, nos EUA, da extração de petróleo de xisto, de alto impacto ambiental, e a retomada da produção do Iraque e do Irã, após acordo diplomático que retirou sanções econômicas impostas aos países.
"Nunca se produziu tanto petróleo e nunca houve tanto óleo estocado. Esse cenário deixa os preços a US$ 40 e em viés de baixa, o que exige muito cuidado para as empresas", avalia Lavinia Hollanda, coordenadora de pesquisa da FGV Energia. "Associado a uma tendência quase irreversível por uma demanda menor, o cenário deve permanecer no médio prazo."
Uma das mudanças já em curso é a atuação da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), que deixou de se preocupar com a fixação dos preços para priorizar seu nível de participação no mercado. A Arábia Saudita é uma das mais beneficiadas, com volumes de exportação acima de 5 milhões de barris por dia e custo de produção abaixo de US$ 25.
"Desde o ano passado, os sauditas sinalizam que não serão mais definidores de preço, mas querem manter o market share. Eles têm condição de fazer isso em função da vantagem competitiva pelo custo inferior de produção", explica Roberto Santos, sócio do Centro de Energia e Recursos Naturais da EY.
Pré-sal. Para a Petrobrás, a viabilidade do pré-sal é garantida até o patamar de US$ 30. Segundo o diretor da estatal PPSA, Renato Darros, a queda deixa "a indústria toda sob ameaça", e não apenas o pré-sal brasileiro. "Será uma ameaça se esse nível se mantiver e for uma nova realidade. Hoje, não dá para falar que é uma ameaça, porque a gente olha para a frente."
Entretanto, a queda afeta marginalmente a cadeia do setor, à medida que interfere sobre o planejamento de leilões, fundamentais para manter a indústria de suprimentos aquecida. As empresas têm adotado diferentes estratégias para se adaptar ao cenário imprevisível. A primeira medida foi o corte de gastos, que chegou a patamares de 40% entre as principais petroleiras multinacionais. Agora, as empresas buscam reduzir o custo dos projetos e inovar em tecnologia.
As empresas também vão vender ativos, como a Petrobrás, mas avaliam o risco de um excesso de vendas a preços desfavoráveis. A situação levou a estatal a revisar seu plano de desinvestimentos, que previa arrecadar US$ 57 bilhões.
"Diante da redução do fluxo financeiro, a empresa precisa buscar os desinvestimentos ou novas parcerias para ganhar fôlego de caixa. Mas o momento não é o mais favorável para quem está vendendo. Podemos ter uma superoferta de ativos à venda, o que puxa o preço para baixo. As empresas que não estão tendo facilidade", diz Santos, da EY.
Demissões. As mudanças já provocaram demissões no setor e o cancelamento de projetos. Outra consequência é a queda na arrecadação dos governos. Para Lavinia, da FGV, a queda causa impacto no "equilíbrio fiscal" de países como Venezuela e Rússia altamente dependente da exportação. "Qual o break even (ponto de equilíbrio) fiscal desses países? Países exportadores dependem dessa venda para fechar as contas. Estamos falando de Rússia, Venezuela, que têm cenário político sensível, e tinham break even com barril acima de US$ 80. Qual a capacidade desses países em cenário de desconforto político, manter a produção e conviver com esse preço nesses níveis atuais?", questiona.
O problema afeta ainda os municípios. "A receita generosa dos royalties que chegou aos municípios provocou um sentimento nas gestões municipais de que poderiam viver de renda. O Estado atuou pouco para gerir uma política de desenvolvimento regional, como a criação de um fundo para reduzir o impacto das perdas. Não se aproveitou o momento. Agora, nunca mais vamos ter uma situação como a que se vivia", avalia o professor do Instituto Federal Fluminense (IFF), de Campos, Roberto Moraes.
Estadão Conteúdo
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